Diário de Paris, 19 de fevereiro de 2022
Texto e fotos de Marcus Ozores
Hoje Paris nos presenteou novamente com um dia ensolarado e temperatura amena. Acordei, fui à sala e pronto: lá estavam elas as novas tulipas no vaso (desculpem ontem pois nomeei as tulipas como papoulas, obrigado Clara pelo aviso) fazendo passo de ‘art nouveau’ chega até a lembrar as bailarinas do Degas (que o Masp em Sampa tem coleção veja aqui ). E como hoje é domingo, é o dia predileto do Jesus Cristinho que sempre quer ver os filhos do seu pai bem aqui na Terra, por isso, ele sempre passa para ver as saídas das missas para ver se o rebanho do pai está cumprindo direitinho suas rotinas.
E como hoje é domingo é aquele dia que os parisienses saem pela cidade e conforme a primavera se aproxima você encontra com multidões em qualquer quartier da cidade. Hoje saímos do apê e fomos em direção a Gal Leclercq e no balão da igreja Saint Pierre de Mont Rouge pegamos a perpendicular da esquerda, Avenue du Maine. Objetivo era almoçar num dos restaurantes do Léon de Bruxelles (veja aqui), rede especializada em ‘moules et frites’.- no brasil conhecido como mexilhão (o mais parecido com as moules do Léon)- localizada no Boulevard de Montparnasse bem em frente à igreja Notre Dame des Champs. Daí fomos subindo Avenue du Maine até encontrar a Rue de la Gaité (rua da alegria numa tradução direta).
Essa é antiga rua dos teatros parisienses que divide espaço com restaurantes, creperias (aqui ficam as melhores creperias da cidade (veja aqui) distribuídas em duas quadras da rua. Há uma infinidade delas e não deixe de pedir uma garrafa de cidra bretã para acompanhar seu crepe salé), hotéis quatro a cinco estrelas para turistas que tenham bala na agulha para pagar entre 200 a 500 euros a diária e muitas e muitas casas de massagens e de strippers. O anúncio de uma delas chama atenção ‘Odyssex’.
Pelo jeito até o Ulysses , ao longo dos dez anos que separam o fim da guerra de Tróia para voltar para seu reino em Ítaca – e antes de abraçar sua amada Penélope – deve ter dado uma passada por esses caminhos onde as sereias cantam e encantam das janelas os marinheiros desavisados que passam por aqui.
As 13h00 chegamos ao Léon de Bruxelles, depois de caminharmos mais de 2 km. Aí com cardápio na mão escolhi o óbvio. Moules traditionelle e fritas. Preço 13,9 euros. Minha papilas gustativas começaram a molhar a boca só de ler o cardápio e ver as fritas das mesas ao lado. Não existe nada igual no mundo como as batatas fritas da Bélgica, nada. Podem acreditar são fantásticas. Findo almoço pé na estrada novamente. Direção Igreja Saint-Merry no coração do Marais, no 3éme, ao lado do Centro George Pompidou, mais conhecido com Beaubourg.
Todos os domingos a sociedade de amigos da igreja promove concerto de piano e hoje logo de manhã ao abrir o aplicativo do l’Officiel des Spetacles lá estava a apresentação do pianista Herbert du Plassis como destaque da redação. Melhor ainda, entrada grátis. Depois de uma caminha de mais 3,5 km chegamos na porta da igreja onde já havia uma longa fila de cabelos brancos. Só podia ser ali.
As 15:40 a porta da igreja se abriu e em poucos minutos todos os assentos estavam tomados. Tivemos a sorte de pegar a primeira fila atrás do piano de cauda montado no meio da igreja e rodeado de cadeiras. Confesso que há muito não ouvia uma apresentação tão fantástica. O programa ambicioso e cumprido com maestria foram duas séries de estudos de Chopin: 12 Études Op. 25 e 12 Études, Op. 10. Total uma hora. Após intervalo Herbert voltou ao palco para apresentar obras do russo Modeste Mussorgski. Primeiro foi ‘Quadros de uma exposição’ e na sequencia apresentou mais quatro peças sendo que a segunda, intitulada Sepulcrum Romanum (Catacombae), me comoveu. No primeiro acorde silêncio absoluto e entra nota longa seguida por acordes lentos vão tomando os espaços como se os presentes estivessem sendo invadidos pelas notas que brotavam do piano. Nesse momento até tive a impressão de ter visto o Quasímodo de Notre Dame de um lado e de outro a baronesa Dudevant, mais conhecida por seu pseudônimo, George Sand. A grande escritora romântica que foi amante de Chopin durante vários anos. Se você vier a Paris não deixe de visitar o Musée de la Vie Romantique que fica na ex-casa de George Sand e Chopin, no 9éme arrondissement.
Fim do espetáculo Hebert foi longamente aplaudido, e em pé, por várias pessoas (inclusive minha pessoa na primeira fila), coisa rara acontecer em Paris. Aqui ninguém aplaude em pé à toa diferente das Terras de Pindorama onde qualquer músico de quinta qualidade basta finalizar acorde e a massa está aplaudindo como se fosse a maravilha do mundo.
Fim do dia um café no Café Beaubourg que fica bem centro do mesmo nome que fica duas quadras da igreja e na mesma rua. Depois pegar de volta a Rue de Saint-Bom (quase tudo tem nome de santo por aqui) direto em direção ao Sena até a praça da Tour de Saint-Jacques e pegar o ônibus 38 que vai direto para o apê. Em frente ao ponto avisto uma longa fila de pessoas. Era fila para tomar sopa oferecida por alguma ONG que atende os necessitados. Aliás, o que parece unir o mundo todo é o país da fome. Amanhã tem mais.
Post scriptum: dia triste hoje. Minha república anarquista livre de Barequeçaba e as demais cidades do Litoral norte foras atingida por trombas d’água com mortes, muitos desabrigados e várias praias isoladas em decorrência da queda de barreiras. Veja aqui como ajudar os desabrigados