Diário de Paris, 20 de fevereiro de 2023
Texto e fotos de Marcus Ozores
Desta vez não saiu na capa do New York Times, mas nas capas do The Guardian e do Le Parisien – veja aqui. Mas, a tragédia ecológica ocorrida, de sábado para domingo, na minha República Livre Anarquista dos Tupinambás de Barequeçaba está na primeira páginas desses dois importantes jornais europeus. Triste realidade nos Tristes Trópicos como diria o filósofo e antropólogo francês Claude Levi Strauss professor da USP, na década de 30 do século passado.
Hoje, segunda feira e dia luminoso em Paris com temperatura de primavera decidimos ir ao Musée de La Vie Romantique, no 9éme, já que ontem eu achei que tivesse visto o fantasma de George Sand. E do apartamento até lá, que é longe prá xuxu apenas um ônibus, o 68, que sai da Porte d’Orleans e vai até Place de Clichy, onde está o famoso estonteante incrível Moulin Rouge, que nunca entrei. Só passei na porta centenas de vezes, nem cartaz olhei.
A viagem dura 45 minutos de busão, atravessando a cidade do sentido sul-norte, quase em linha reta passando por dezenas de lugares turísticos como Louvre, Opera Garnier, Café de Paix, Galleries Lafayete (passei em frente e está funcionando, aleluia consumidores!), Boulevard des Capucines etc etc etc, todos lugares onde o bolso da classe média brasileira passa longe longe longe com o realzinho desvalorizadinho como está. Descemos no ponto da Place de Clichy, olhei no relógio de pulso (criação do nosso patrício Santos Dumont, aqui mesmo em Paris) e já marcava 13h00, hora portanto de almoçar. Descemos bem em frente ao legitimo bistrot francês como há tempos não via. Daqueles que não existe menu mas o Monsieur vem com a ‘ardoise’ onde você escolhe o menu do dia com vários opções e o preço, ai sim, o preço ‘baradinho, baradinho’ como diria meu amigo Nasser, nascido na Palestina, e companheiro das xícaras no Café Regina, em Campinas.
O plat du Jour por 11euros ou plat + dessert ou entrée + plat por 13,90. Pichet de 250 ml de vinho excelente, acreditem por 6 euros. Depois de almoçar e se deliciar com o ambiente vi, no dr. Google, que o ‘Bistrot 27’ é recomendadíssimo pelos guias e listado como um dos melhores na cidade (veja). Em Paris a aparência nada tem a ver com preço e qualidade da refeição.
Findo almoço tomamos o rumo ao Musée de La Vie Romantique que, como disse ontem, se localiza na antiga casa onde George Sand mora com seu amante Chopin, na rue Chaptal. Surpresa maior foi que, dividindo parede com o museu, um cour e, no fundo, a placa do ‘International Visual Theatre’. Mas, na placa ‘Histoire de Paris’ colocado ao lado do cour informa que nesse local funcionava o antigo ‘Théatre du Grand Guignol’.
Daí foi como um raio tivesse caído no inicio da tarde. Explico: tenho ajudado há vários anos a Wilma na publicação de um caderno de viagem de Afonso Taunay, filho do Visconde de Taunay. Esse texto é inédito e encontramos numa das caixas que o Museu Paulista (visite o museu virualmmente aqui adquiriu da família Taunay, lembrando que Afonso foi o idealizador do Museu Paulista para sua reinauguração em 1922, centenário da Independência. E porque um raio caiu no meio da tarde. Explico novamente:
Afonso morou com a família um ano em Paris entre 1909 e 1910 onde nasceu seu segundo filho. Porém, em algumas noites, meio escondido da mulher ele vinha acompanhado sempre pelo amigo Betim a esse teatro. O teatro foi fundado em 1896 e era especializado em peças com histórias macabras e sangrentas e, por extensão, deu nome ao gênero teatral , le grand guignol, e ao adjetivo grand-guignolesque . O termo tornou-se pejorativo ao longo do tempo e agora designa, de forma mais geral, obras que abusam da violência ou de efeitos grandiloquentes. Imagino o recato e lar Afonso Taunay, o senhor de finos tratos que vinha escondido aqui para se deliciar com mulheres de seios nus e cenas sangrentas de terror. O endereço é Rue Chapal, numero 7 ao lado do Musée de La Vie Romantique que estava fechado e só abre de terça em diante. O Grand Guignol só cerrou as portas 1962. Outra informação: o livro da Wilma (saiba mais aqui) com a transcrição do caderno de anotações do Afonso Taunay e vários artigos vai sair pela Editora da Unicamp ainda nesse semestre. Fecha pano rápido para o merchandising.
Com um sol maravilhoso e temperatura amena, a descida do 9éme em direção à Place da Opera ainda reservava uma surpresa. Por isso, aconselho as pessoas que vem para Paris reservarem uns dois dias e perambularem pela cidade sem rumo, só assim você permitirá que o acaso possa te surpreender através dos seus sentidos se deixando guiar pelos cheiros, pelas cores, pelas luzes através dos antos e cantos da antiga Lutèce.
Descendo a rua rue Catherine-de-La-Rochefoucauld passamos por uma série de edifícios do século XIX e vimos onde placa da ‘Histoire de Paris’ informando que esse foi bairro de artistas, poetas, escultores e pintores e que ficou conhecido, a partir de 1857, como a ‘Nova Atenas’ um movimento que buscava inspiração na cultura clássica grega. Isso foi bem antes de Montmartre virar o lugar preferido dos surrealistas, cubistas, dadaistas etc etc.
Alguns metros abaixo da placa com as informações, um museu que nunca soube da da sua existência: Musée Gustave Moreau,este aberto todos os dias. Entrada 7,5 euros cada e não adianta chorar dizendo que já viveu mais de 7 décadas. Nada comove a mocinha da bilheteria, nem puxando a perninha ela dá desconto.
O museu é espetacular (veja) contendo cerca de 850 de pinturas ou cartoons, 350 de suas aquarelas, mais de 13.000 desenhos e traçados, 15 esculturas de cera. Todos de autoria de Moreau. A casa e atelier tudo junto (que vocês verão nas fotos) é fascinantes dividido em 3 andares e o térreo. Se vocês prestarem atenção nas obras expostas verão que Moreau bebeu em muita gente antes como Hyeronymous Bosch e foi precursor, sem dúvida, do surrealismo, do cubismo, dadaímos e outros ismos mais do final do XIX e começo do XX. Os quadros te levam a dimensão de sonhos, incrível a técnica de
Moreau. Aqui você pode perder algumas horas que só acrescentará algo novo para sua vida.
Descendo o morro depois de muitos quilômetros pegamos o 68 para voltar para o apê direção porte d’Orleans. Ah, ia me esquecendo a Opera Garnier está em obras, portanto, nada de foto com a fachada dourada da Escola Nacional de Música. Na volta, dentro do busão, foto da praça do triangulo de vidro do Louvre com gente saindo pelo ladrão.
Amanhã tem mais.