Texto e Fotos de Marcus Ozores
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Informo que a greve marcada para iniciar na próxima terça-feira, dia 7 de março, já começou. Vejam só. Como a minha sobrinha Victoria e amiga Jana estão aqui conosco no apê, passando 15 dias demarcada para iniciar na próxima terça-feira, dia 7 de março, já começou. Vejam só. Como a minha sobrinha Victoria e amiga Jana estão aqui conosco no apê, passando 15 dias de férias, o programa hoje era visitar o Chateau de Versailles e seus lindos jardins. Melou o programa. Vou explicar.
Para ir a Versailles é muito fácil saindo aqui do apê, no 14éme. Basta pegar a linha 4 de metro até estação de Saint Michel e lá entrar no RER C que vai direto ao castelo. Ao desembarcarmos hoje na estação de Saint Michel, uma das mais antigas de Paris, todas as entradas para o RER C estavam fechadas e não tinha nenhum cartaz avisando nada. Como as estações dos RERs são muito distantes umas das outras – já que é trem e não metrô – saímos para rua e pegamos um ônibus que costeava o Sena, na margem esquerda, pelo Quai de Saint Michel até o Museu d’Orsay, pois, lá está outra boca do RER C. Chegamos e as duas entradas estavam fechadas. Nada de cartaz. Fazia um frio desgraçado e daí eu decidi perguntar a uma das moças do museu que organizam as filas de entrada do d’Orsay o motivo da estação fechada. ‘C’est la grève monsieur’ o que prontamente e brasileiramente respondi com outra pergunta (imbecil da minha parte, claro) “Mais la grève ne commencera pas le 7?”Ao que ela sorrindo respondeu: “Oui mais tu sais comment c’est ici à Paris, non?”
Muito bem, sei bem como é aqui em Paris. Enfiei a violinha no saco e, com frio de congelar o som das palavras (ventava muito na beira do Sena), decidimos entrar no museu (previsto pelas meninas para irem na semana que vem) naquele momento, buscando abrigo para o frio.
Acho que deve ter sido a décima vez que volto ao d’Orsay mas, confesso a vocês, que sempre é um prazer imenso voltar a circular pelas salas dos impressionistas e as escolas subsequentes ao movimento e nunca me canso de voltar a visitar o edifício pela beleza da sua arquitetura. Até 1878 funcionou aqui o ministério das Relações Exteriores. Em 1898 o antigo prédio do ministério foi transformado na estação ferroviária que ligava Paris a Orleans. A inauguração da estação foi para receber um fluxo de parte dos milhões de pessoas que vieram a Paris, em 1900, para a Exposição Universal do novo século. No ano da Exposição foi inaugurada a primeira linha de metrô da cidade e a iluminação de rua, daí que Paris ficou conhecida como cidade luz. A estação ferroviária deixou de operar nos anos de 1970 e durante o governo socialista de François Mitterand o prédio da Estação foi totalmente reformado e abriu as portas como museu abrigando coleção de quadros e esculturas dos artistas do século XIX e começo do XX.
Você pode visitar virtualmente o D’Orsay aqui
No d’Orsay estão obras de Van Gogh, Cézanne, Degas, Maurice Denis, Odilon Redon, Monet, Manet, Pissaro, et. etc. etc. e vão muitos etecéteras por ai. A exposição permanente é fascinante e se vier outras vezes a Paris voltarei aqui. O museu é grande, porém, a distribuição das salas é moderna para facilitar a circulação. É visita obrigatória para quem não conhece. O d’Orsay é oposto do Louvre (onde já fui umas 30 vezes quando morava aqui, pois, na época não pagávamos entrada por estarmos ligados a EHESS, isso há mais de 20 anos) que é imenso e você não conhece conhecer nem 1/20 da coleção num dia inteiro.
Fazia uns cinco anos que não vinha ao d’Orsay e, logo ao entrar, você tem a visão do Jardim de Esculturas onde antes operavam as plataformas da Gare d’Orsay. É um Jardim das Delicias, um Jardim de Arte, de arte produzida por artistas sensíveis que expressam o seu mundo particular através do mármore, do bronze e tintas e telas. Ao me defrontar com essa imagem do alto, me sinto dentro do quadro ‘Jardim das Delicias Terrenas’, tríptico de Hyeronimus Bosch, que pertence a coleção do Prado, em Madri. E me refiro a Bosch aqui porque ele foi um artista cuja obra estava séculos antes do seu tempo e foi referência, sem duvida, para os surrealistas.
Bem, antes de descer para esse Jardim das Delicias, como eu chamo, o caminho natural é subir para o 5° andar, onde estão telas e esculturas dos impressionistas. Aí você deve se deixar levar pelos seus sentidos e sentimentos. Afinal, as imagens e esculturas dos artistas desse andar todo fazem ou fizeram parte do nosso cotidiano nos produtos que consumimos e na publicidade. Quem já não teve em casa ou apartamento um quadro com reprodução do autorretrato de Van Gogh?. Ou então um quadro com as Ninfeias de Monet?. E os quadros de Pissaro então, para mim, o mais perfeito. E quem não teve uma escultura ou quadro de Degas (aliás nosso Masp em Sampa tem) na sua sala ou na mesa do escritório.
Ou então, qual mocinha não teve um diário intimo cuja capa era reprodução do quadro ‘Mulher com Sombrinha’ de Claude Monet. E a “Lagoa dos Lirios d’Água” então quem nunca teve um? Claro que isso foi moda nos 80 e 90 mas todos nós, mais velhos, é claro, temos em algum lugar dos escaninhos da memória lembrança de algum objeto, quadro, camiseta, xicara, lápis com tema dos impressionistas. O legal no d’Orsay, para nós, mais provectos, é deixar a mente voar livremente vendo e fazendo associações entre o real e concreto que está na sua frente exposto e o imaginário e, até mesmo inventado, que carregamos dentro de nós. Não importa como você veja a realidade apenas deixe se levar pelo sentimento do momento. Deixe-se levar….
Curioso observar como alguns quadros atraem mais a atenção do público e formam um amontoado de pessoas em frente a determinadas obras que impedem a visão do resto do público. O quadro do quarto de Van Gogh tem essa capacidade e me faz lembrar que nunca consegui ver a Mona Lisa, no Louvre. Todas as quase 30 vezes que lá fui, passei em frente, pois, à época havia sempre duas centenas de japoneses com suas máquinas fotográficas de então se fotografando ao lado do quadro. Isso na era antes digital, imagino atualmente como deve estar. Ainda bem que nunca mais vou lá.
Dois pontos em toda visita a museu aqui na Europa que me chamam atenção. O primeiro é com relação aos professores de ensino primário e secundário e seus alunos. Hoje foi sábado e o d’Orsay estava cheio de professores e alunos sentados no chão tendo aula sobre arte, direta da fonte. Isso sempre foi proposta escolar na Europa e em qualquer país ou cidade que você esteja essa cena se repetirá.
Outro detalhe que me alegra é ver como os nossos irmãos asiáticos, principalmente as japonesas, se preparam para visitar Paris. Acho que passam o ano inteiro se preparando para usar uma roupa diferente em cada saída pela cidade (não inventei não. Já li centenas de matérias a respeito). Elas se vestem lindamente e muitas vezes parecem bibelôs. Mas não são só as asiáticas não, estar em Paris parece que mexe com a cabeça das pessoas e elas sempre estão prontas para um selfie. Afinal, todo pintor para ser bom pintor tinha que fazer sua própria selfie, não é mesmo?
Amanhã tem mais.