Hoje, 27/01, é sábado e amanhã é domingo e a vida vem em ondas como o mar (Egeu?)
Assim começa o poema “Dia da criação’, de autoria do nosso poetinha maior, Vinicius de Moraes. E, como hoje é sábado, viagem pela cultura e arte de Atenas
Cabe aqui uma explicação: para os atenienses toda a região central da cidade onde estão as centenas de restaurantes e comércio para turistas é chamada de Ágora. O que se chama Ágora Grega, no entanto, é a denominação de um imenso parque fechado, por cerca de ferro, onde localiza-se o espaço da antiga Ágora ateniense berço da democracia durante o governo de Sólon, no século VI a.C. E aqui dou uma dica: não conheçam a Ágora no seu primeiro dia na cidade, deixe a visita mais para o fim. Assim você poderá apreciar melhor o sentido desse antigo espaço público frequentado pelos homens e mulheres livres de Atenas.
Lembrando que Atenas, no século V a.C, tinha aproximadamente 40 mil cidadãos livres e mais de 100 mil escravos e, foram esses escravos, que construíram essas belezas de edifícios que vemos e fotografamos hoje.
Nesse imenso parque existe uma floresta de pilastras e muralhas, restos de edifícios públicos construídos a partir do século VII a.C. Ágora localiza-se no sopé do morro onde está o Parthenon e uma estrada, a Panatemaica, liga até hoje a cidade de Atenas ao templo da deusa Athena, no alto do morro. Essa estrada, construída ao longo do século VII a.C, era usada para uma procissão anual que a população ateniense cumpria ao templo em homenagem a sua deusa.
Após a procissão ocorriam dias seguidos de competições esportivas e os jovens vencedores, além dos louros de galhos de oliveira, ganhavam algo semelhante a uma taça, costume mantido até hoje nos eventos esportivos e o modelo dessa taça está presente até hoje, no nosso cotidiano, um deles é a garrafa de Coca-Cola, uma cópia modificada, a partir do modelo ateniense.
Nesse cemitério de palácios públicos é possível visitar o templo dedicado a Hefesto, deus da metalurgia e Athena, deusa (entre outras virtudes) dos artesãos. De acordo com os manuais esse é o mais perfeito templo grego conservado até os nossos dias. Aliás, do século VII d.C. até o ano de 1834 esse templo foi convertido em igreja cristã. Fiz várias fotos do templo – que publico no final desse texto – tendo ao fundo, no alto do morro, o Parthenon e Acrópole. Em toda essa área, do parque da Ágora, existiam mais de vinte prédios públicos dentre eles palácio da Justiça, vários templos gregos e romanos e três Stoas que eram prédios, com mais de 150 metros de comprimento por 20 de largura, onde existiam boxes destinado ao comércio e aos negócios. Uma espécie de shopping center da época.
De cima do morro, onde está o templo Hefesto, tem-se uma vista espetacular dos escombros dos diversos edifícios públicos plantados nesse espaço. Tem-se que destacar que a Ágora sofreu inúmeras invasões e conheceu períodos de glória e decadência nesses últimos dois mil e setecentos anos.
A Ágora foi totalmente destruída pelos persas, na invasão do século VI a.C, reconstruída durante o governo de Péricles (sempre ele); depois Atenas caiu em mãos do império romano, durante quase 700 anos; daí foi invadida pelo império bizantino; depois vieram os franceses durante as cruzadas idade média; depois os venezianos que bombardearam Acrópole em 1687; depois império Turco Otomano….. depois… e assim até quase a independência da Grécia ocorrida no mesmo ano que a do Brasil, 1822.
Na longa caminhada em trilhas serpenteadas por ciprestes e oliveiras em determinado momento você se depara com uma igreja Cristã Ortodoxa grega, datada do final do século X, a Igreja de Todos os Santos, mas atenção, você não chegou na Bahia.
Por último a visita ao museu arqueológico da Ágora localizado na Stoa de Átalo, prédio reconstruído integralmente com recursos da Escola Americana de Estudos Clássicos de Atenas. Nesse museu estão as peças encontradas, nesse imenso sítio arqueológico, que abriga restos da civilização humana há mais de oito mil anos, desde a idade da pedra.
Um fato que me chamou atenção desde que iniciei visita a esse país e a essa cidade é que durante o chamado período geométrico que os arqueólogos denominam a arte das cerâmicas, por volta de 8 mil atrás, os desenhos que ornam as ânforas, panelas e outros utensílios são parecidíssimas com arte marajoara que encontramos, até hoje, no mercado do Ver o Peso, em Belém e de algumas tribos do alto Solimões e baixo Peru, disponíveis no mercado Adolpho Lisboa, em Manaus.
Para finalizar cabe uma explicação. Toda essa área da Ágora que visitamos hoje não existia até o início dos anos 1950. Lembrando que a Grécia foi invadida pelas tropas alemães e italianas durante a segunda guerra e, com o armistício, a população empobrecida de Atenas vendeu para o milionário norte americano, John D. Rockefeller, as 400 casas e lojas de comércio que existiam nessa área que hoje você caminha por trilhas entre ciprestes, oliveiras, corvos, esquilos, muitos gatos e uma cobertura verde que circunda os escombros dos prédios gregos, romanos, bizantinos. Aí você tem a sensação de caminhar sobre história viva desse berço cultural.
Antes de terminar esse relato não posso deixar de destacar dois pontos que me chamaram atenção. O primeiro são duas esculturas presenteadas pelo governo chinês que retratam um encontro imaginário entre Sócrates e Confúcio. E, por último, as oliveiras que, segundo a lenda, foi um presente da deusa Athena, para os atenienses e os gregos. Ao me aproximar de uma centenária oliveira observei o chão coberto de frutos negros e imediatamente pensei: a oliveira é para os gregos, o que a jabuticabeira é para nós brasileiros, um presente de Tupã. Amanhã tem mais.