Diário do ano da Peste de 12 de outubro de 2021
Texto e vídeo de Marcus Ozores
E hoje é feriado dia 12 de outubro , 0uma terça feira e nada de novo no front. Continuamos aqui na nossa Republica Anarquista Livre dos Banhistas das Terras Xamânicas dos Tupinambás de Barequeçaba lançando nossas granadas em defesa da vida com “Só a poesia nos Salvará”.
Em feriados como o dia hoje, lembro saudosamente do meu finado e querido amigo J. Toledo, ou simplesmente Jotinha, como os amigos íntimos o chamavam. Jotinha foi pintor excelente e surrealista por excelência, cronista, biógrafo, fotógrafo dos melhores que conheci, grande bebedor de whisky, notívago, e um dos grandes conversadores da barranca do rio Atibaia que passava exatamente no fundo da casa dele em Sousas. E vocês vão me perguntar porque me lembrei do Jotinha hoje?
Simples diria a vocês, Jotinha me veio à mente depois de ler no portal do Uol a declaração do nosso comediante hours concours, o nosso Paulo Guedes, ou nosso Guedinho ministro da Fazenda já que de economia não entende nada mesmo, e é melhor entender de grama, boi e vaca. E o que foi que o Guedinho boiadeiro respondeu aos jornalistas que me fez lembrar de Jotinha. Guedinho disse que a culpa da inflação é dos brasileiros, afinal comem muito e gastam muita energia. “Craro”, Guedinho, você tem razão. O governo do capitão ainda vai zerar a inflação zerando a vida dos pobres.
Portanto, para reduzir a inflação povão, deixem de comer e desliguem a chave geral da luz da casa de vocês. Jotinha como surrealista que era se sentaria ao entardecer na sua cadeira na varanda do seu escritório que dava para o Atibaia e diria: “cumpadre, esse Guedinho é um asno”. E a conversa seguiria como as águas do Atibaia e sempre regada com um Macallan Single ‘on the rocks’.
E assim como as águas do Atibaia rumam calmas , nossa nau da língua portuguesa também permanece mais uma vez em Campinas e leio dois poemas de uma amiga e companheira de copo e de noite do meu amigo Jotinha e que também já partiu desse mundo para melhor , creio eu, e de quem já li poemas dela ano passado. Falo da poeta Hilda Hilst nascida no Jaú em 21 de abril de 1930 e falecida na sede da casa da sua fazenda a Casa do Sol em Campinas, em 4 de fevereiro de 2004.
Vou ler dois poemas de Hilda Hilst
DEZ CHAMAMENTOS AO AMIGO
Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo. Porque esta noite
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água
Desejasse
Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.
Te olhei. E há tanto tempo
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta
Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.
PASSEIO
De um exílio passado entre a montanha e a ilha
Vendo o não ser da rocha e a extensão da praia.
De um esperar contínuo de navios e quilhas
Revendo a morte e o nascimento de umas vagas.
De assim tocar as coisas minuciosa e lenta
E nem mesmo na dor chegar a compreendê-las.
De saber o cavalo na montanha. E reclusa
Traduzir a dimensão aérea do seu flanco.
De amar como quem morre o que se fez poeta
E entender tão pouco seu corpo sob a pedra.
E de ter visto um dia uma criança velha
Cantando uma canção, desesperando,
É que não sei de mim. Corpo de terra.