Texto Priscila Siqueira
Foto João Siqueira e Priscila – arquivo pessoal
Em plena ditadura militar, João Augusto Siqueira, cirurgião dentista que trabalhava na Petrobrás, no Sindicato dos Petroleiros e em seu consultório particular fazia voluntariamente o trabalho de provedor da Santa Casa de Misericórdia, que, então, era responsável pelo Hospital de Clínicas de São Sebastião.
Segundo seu testemunho no livro “Sonhos de Julieta”, “eram tempos difíceis. O dinheiro era muito curto, uma vez que na época não havia planos de saúde, nem INSS. A pessoa que não podia pagar era denominada “00”, isto é, um paciente não pagante… Por sua internação e tratamento, o hospital recebia uma pequena subvenção do Estado de São Paulo. E a grande maioria de nossos pacientes estava nessa situação. Atendíamos não só pessoas de São Sebastião, mas de Ilhabela, Caraguatatuba, Ubatuba e até mesmo de Paraty, no litoral fluminense”.
A visita do Delegado e a suspeição
Numa tarde, em seu consultório particular, ele recebeu a visita do Delegado Seccional do litoral norte paulista, dr. Ernesto Vivona. Muito simpático e bom falante, Vivona começou a especular o porquê de João Augusto ir todas os dias, depois de seu trabalho, ao Hospital de Clínicas.
-“Ora, porque sou seu Provedor e tenho de acompanhar o trabalho do Hospital, desde o atendimento médico até como vão nossas finanças”, foi a resposta.
Dando uma risada marota, o Delegado deixou o consultório. Ele havia recebido uma denúncia de uma profissional que trabalhava no hospital, dizendo que o dentista participava diariamente de reuniões subversivas realizadas naquele local. Sua raiva era porque, havia sido proibida de internar seus pacientes particulares no hospital. Como o hospital era pobre, a regra obedecida por todos os médicos era atender gratuitamente no Pronto Socorro, a fim de internarem seus próprios pacientes. A jovem médica se recusava a seguir a regra. Denunciar o provedor de subversivo foi a forma de punir o provedor, responsável por aquilo que ela considerava injusto… E se o delegado não fosse ouvir o denunciado e acreditasse nela?!… Tempos obscuros de ditadura são assim: qualquer um pode inventar alguma coisa de ruim de outra pessoas conforme seja de seu agrado…
Foi essa a forma que a moça achou para se “vingar” de um superior que não a deixou fazer o que ela queria…