Diário do ano da peste de 22 de outubro de 2021
Texto e vídeo : Marcus Ozores
E hoje é dia 22 de outubro, uma sexta feira véspera daquele dia que nosso Senhor Jesuscristinho gosta de ver todo mundo bem aqui na terra E é por isso que continuo aqui na minha república Anarquistas dos Antropófagos Tupinambás de Barê lançando minhas granadas do “Só a poesia nos Salvará”.
Essa sexta feira, que continuou negra no mercado financeiro, me fez lembrar da novela de Dias Gomes a inesquecível ‘O Bem Amado’. E porque? – vocês me perguntarão. Porquê? E eu responderei, fácil, meu caro Watson. Vejam comigo a cena: o Capitão e seu fiel escudeiro o ministro da Fazenda (já que Guedinho não entende nada de economia mesmo) fizeram declaração pública explicando o inexplicável, isto é, a rasteira na Constituição e uma puta pedalada fiscal. Se fosse Dilma teria impecheament , mas como aqui é o mundo do faz de conta, a dupla que me lembrei foi de Odorico Paraguaçu e seu fiel assessor, o Dirceu Borboleta. Quem viu vai me dar razão, tenho certeza. O divertido foi o Dirceu Borboleta tentando traduzir – para os executivos da Faria Lima – o que Odorico Paraguaçu está prometendo para o gado da próxima eleição.
E para entender melhor a explicação, que nem o dr. Watson com toda sua sabedoria da Oxford não conseguiu, vamos viajar hoje por uma crônica hilária do jornalista Ruy Castro, publicada na Folha de São Paulo. Ruy Castro nasceu em Caratinga, no vale do aço de Minas Gerais, em 1948 e desde adolescência escreve para os melhores jornais do país. Em 1990 escreveu seu primeiro livro “Chega de Saudade” que foi um dos maiores sucessos de venda no país. Daí para frente não parou mais e está a caminho do seu 21º livro. Todos, sucessos editoriais. Ruy Castro escreve semanalmente na Folha de São Paulo. Vou ler de Ruy Castro a crônica:
Melhor idade
Ruy Castro
Melhor idade é a puta que te pariu – a melhor idade é de 18 aos 40 anos…
A voz em Congonhas anunciou: “Clientes com necessidades especiais, crianças de colo, melhor idade, gestantes e portadores do cartão tal terão preferência etc.”. Num rápido exercício intelectual, concluí que, não tendo necessidades especiais, nem sendo criança de colo, gestante ou portador do dito cartão, só me restava a “melhor idade” – algo entre os 60 anos e a proximidade da morte.
Para os que ainda não chegaram a ela, “melhor idade” é quando você pensa duas vezes antes de se abaixar para pegar o lápis que deixou cair e, se ninguém estiver olhando, chuta-o para debaixo da mesa. Ou, tendo atravessado a rua fora da faixa, arrepende-se no meio do caminho porque o sinal abriu e agora terá de correr para salvar a vida. Ou quando o singelo ato de dar o laço no pé esquerdo do sapato equivale, segundo o João Ubaldo Ribeiro, a uma modalidade olímpica.
Privilégios da “melhor idade” são o ressecamento da pele, a osteoporose, as placas de gordura no coração, a pressão lembrando placar de basquete americano, a falência dos neurônios, as baixas de visão e audição, a falta de ar, a queda de cabelo, a tendência à obesidade e as disfunções sexuais. Ou seja, nós, da “melhor idade”, estamos com tudo, e os demais podem ir lamber sabão.
Outra característica da “melhor idade” é a disponibilidade de seus membros para tomar as montanhas de Rivotril, Lexotan e Frontal que seus médicos lhes receitam e depois não conseguem retirar.
Outro dia, bem cedo, um jovem casal cruzou comigo no Leblon. Talvez vendo em mim um pterodáctilo(que têm os dedos ligados por uma membrana) da clássica boemia carioca, o rapaz perguntou: “Voltando da farra, Ruy?”. Respondi, eufórico: “Que nada!
Estou voltando da farmácia!”. E esta, de fato, é uma grande vantagem da “melhor idade”: você extrai prazer de qualquer lugar a que ainda consiga ir.
Primeiro, a aposentadoria é pouca, quase uma esmola, e você tem que continuar a trabalhar para melhorar as coisas. Depois vem a condução.
Você fica exposto no ponto do ônibus com o braço levantado esperando que algum motorista de ônibus te veja e por caridade pare o veículo e espere pacientemente você subir antes de arrancar com rapidez como costumam fazer.
No outro dia entrei no ônibus e fui dizendo: – “Sou deficiente”.
O motorista me olhou de cima em baixo e perguntou: – “Que deficiência você tem?”
– “Sou broxa!”
Ele deu uma gargalhada e eu entrei.
Logo apareceu alguém para me indicar um remédio. Algumas mulheres curiosas ficaram me olhando e rindo…
Eu disse bem baixinho para uma delas:
– “Uma mentirinha que me economizou R$ 3,00, não fica triste não”, foi só para viajar de graça.
Bem… fui até a pedra do Arpoador ver o por do sol.
Subi na pedra e pensei em cumprir o ritual que costuma ser feito pelos mais jovens no local. Logicamente velho tem mais dificuldade. Querem saber?
Primeiro, tem sempre alguém que quer te ajudar a subir: “Dá a mão aqui, senhor!!!”
Hum, dá a mão é o cacete, penso, mas o que sai é um risinho meio sem graça.
Sentar na pedra e olhar a paisagem era tudo o que eu queria naquele momento.
É, mas a pedra é dura e velho já perdeu a bunda e quando senta sente os ossos em cima da pedra, o que me faz ter que trocar de posição a toda hora.
Para ver a paisagem não pode deixar de levar os óculos se não, nada vê.
Resolvo ficar de pé para economizar os ossos da bunda e logo passa um idiota e diz:
– “O senhor está muito na beira pode ter uma tontura e cair.”
Resmungo entre dentes: … “só se cair em cima da sua mãe”… mas, dou um risinho e digo que esta tudo bem.
Esta titica deste sol esta demorando a descer, então eu é que vou descer, meus pés já estão doendo e nada do por do sol.
Vou pensando – enquanto desço e o sol não – “Volto de metrô é mais rápido…”
Já no metrô, me encaminho para a…