Diário de Pindorama
Texto, vídeo e apresentação de Marcus Ozores
Diário de Pindorama, 4 de março de 2022, sexta-feira e sigo com o “Só a poesia nos Salvará” do meu isolamento, aqui na minha República Livre Anarquista dos Tupinambás de Barequeçaba.
Essa guerra Rússia X Ucrânia despertou em mim – e em muitos da minha geração – um sentimento antiguerra e pacifista como a minha geração se comportou face a morte inútil de 50 mil jovens norte americanos no Vietnã e Cambodja. Nossos heróis foram Joan Baez, Beatles, Rolling Stones, Janis Joplin, The Who, Jimmi Hendrix, Joe Cooker, Creedance, quase todos esses participantes do festival Woodstock no longínquo ano de 1969.
Não sei mais o que aconteceu. A minha geração que tanto lutou pela paz e contra as ditaduras está partindo lentamente e o nosso sonho juvenil em defesa do paz e do amor (salve geração hippie!) pluft está se desfazendo no ar, como bola de sabão.
Hoje só vejo gente raivosa falando em geopolítica e especialistas em armamentos (ou melhor repetidores vorazes da revista inglesa Jane’s Inteligente Review sobre armas e estratégia). Aliás tem muito jornalista por ai que se diz especialista em armamento que não passa de leitor voraz da Jane’s e um copidesque de terceira que fica amedrontando os leitores do seu velho e capenga jornal.
O que mais me entristece, é que vejo nos noticiários de TV e nos blogs, milhares de jovens perdidos e sem rumo, de vários países , se encaminhando para ir a Ucrânia se oferecer para lutar e morrer sem nem ao menos saber contra quem, como se o tédio do mundo moderno os levasse à guerra, como se fossem participar de um joguinho de computador.
Viva a geração hippie, viva paz & amor viva quem dormiu no slepping bag.
Lerei hoje um poema escrito, em 1966, do monge e grande mestre budista vietnamita Thich Nhat Hanh sobre o cerco da sua vila Plei Mei pelas tropas norte americanas. Esse poema é testemunho pessoal descrevendo o cerco a vila e foi escrito em um papel de caderno em 20/11/65, um mês após o cerco.
A BATALHA DE PLEI ME
Poema de Thich Nhat Hanh
No sono desta noite
urdi todo um sonho
de morte premeditada
e de sangue
como mortalha
*
O cheiro de cadáveres
instilou-me o pesadelo inquebrável
*
O surto de violência
fez morrer a liquidez dos meus olhos apagados
*
Na batalha de Plei Me
o silêncio coa gente de morte
cativou-a
estreitou-a a mãos ambas
*
Como espectral cenário
devastado pela metralha
os cadáveres insepultos
a rigidez de rostos jovens
a quem não brilhou a bandeira da paz
*
O sangue como mortalha
desses corpos
abandonados pelo fogo ao acaso
correm correm correm
como rio desvairante
sem foz
*
A batalha de Plei Me
a luxúria macerada do crime
a nudez da morte premeditada
*
Cúmplices nessa batalha fomos nós
que não lutamos para que haja paz
os cadáveres erguem-se
com dedos a apontarem-nos
pobres cadáveres insepultos
fedendo morte irreversível
na batalha de Plei Me