A Crônica do diaCantinho da Priscila Siqueira

O ponta pé

MAIS UM CAUSO ENGRAÇADO DE VOVOZINHA

Por Priscila Siqueira*

Era uma senhora extremamente religiosa, católica praticante de missa
e comunhão diárias. De coração aberto aos outros, essa senhora era
querida não só entre os membros de sua família, mas também da de
seu marido que sempre recorriam a ela nas dificuldades da vida. Os
vizinhos e amigos tinham nela um porto seguro em suas necessidades
e nas suas confidências.
Da sua boca nunca saía uma crítica a uma pessoa ou um mal falar de
quem quer que fosse. Nome feio, então, nem pensar. Não admitia que
seus netos “sujassem” a boca om nomes feios.”Vou lavar sua língua
com sabão”, dizia a vó querida dando risada.
Mãe que dera a luz a dez filhos, já idosa precisou fazer uma operação
de períneo. Para grande surpresa de quem a esperava no quarto, ainda
sob o efeito da anestesia, não deixava de repetir-”Deram um pontapé
na minha xoxota, deram um pontapé na minha xoxota!…”!…”
Os filhos não acreditavam no que ouviam da boca de sua santa mãe.
Os netos mais velhos, também no quarto, começaram a rir “Quem

diria, hein, vó”… O marido, tranquilamente, afagou a sua mão e beijo-
lhe a testa.

Com um pacto silencioso, intuído por todos, nunca contaram a ela
o que a conhecera. Se ela soubesse, ficaria muito humilhada. E o que
seria pior, além da vergonha por um “comportamento lamentável”, iria
se culpar para sempre apesar de estar sob efeito de anestésicos.
Mas que ela sentiu ,com toda intensidade, a dor de um pontapé,
ninguém pôs em dúvida …

 

 

*

Priscila Siqueira em foto do APMC de Caraguatatuba de 2020

Priscila Siqueira é jornalista com passagens por grandes órgãos de imprensa como Folha de São Paulo, Estadão, Agência Estado e escritora, autora dentre outros dos livros disponíveis para aquisição nos links, Genocídio dos Caiçaras    ; 2-  Trafico de Pessoas quanto vale o ser humano” 2013/artigo/3aab4aed-94b9-429c-b0e6-7ee4459a5175,  a Outra Face de Eva  

 

 

Priscila Siqueira

Paranaense, nascida em 1939, Priscila Siqueira formou-se em jornalismo na antiga Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, na cidade do Rio de Janeiro. Agora aposentada, trabalhou por muitos anos na Grande Imprensa nacional :Agência Folha de São Paulo, Agência Estado (jornais O Estado de S.Paulo, o extinto Jornal da Tarde e Rádio El Dourado) e no jornal Valeparaibano. Como jornalista teve a oportunidade de presenciar a expulsão dos caiçaras - o caboclo do litoral - de suas praias pela especulação imobiliária, decorrente a abertura da Rodovia BR 101, no seu trecho de Santos - Rio de Janeiro. Dessa experiência, surge seu primeiro livro “Genocídio dos Caiçaras“, em 1984. Jornalista especializada na questão ambiental, cobriu a Constituinte do Meio Ambiente de 88. Como ativista ambiental, foi uma das fundadoras da SOS Mata Atlântica, Movimento de Preservação de São Sebastião- MOPRESS e presidente da Sociedade de Defesa do Litoral Brasileiro. Em 1996, participou do Congresso Mundial contra a Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes, na cidade de Estocolmo realizado pela rainha Sílvia da Suécia e a UNICEF- Nações Unidas para a Infância. Foi professora na antiga Escola Normal de São Sebastião, além de dar aulas no Centro Universitário Salesiano de São Paulo- UNISAL, e na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo- FESPSP, em cursos de pós graduação lato sensu, sobre a Violência à Mulher, Prostituição Feminina e Tráfico de Mulheres e de Meninas.

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