Crônica de Marcus Ozores
Olá, hoje é sábado e amanhã é domingo. Hoje é sábado, dia 7 do mês de agosto do ano da peste de 2021 e continuamos firmes aqui, na nossa república livre anarquista dos banhistas das terras xamânicas dos Tupinambás, em Barequeçaba, lançando nossos botes de salva vidas do Febeapá com o “Só a poesia nos Salvará”.
Devo confessar uma verdade para vocês. Às vezes me sinto como cronista no deserto, isto porque, o Deus Supremo do Consumo a quem a humanidade devotou unilateralmente suas preces no terceiro decênio do século XXI oblitera a visão do universo lírico
Afinal, para o Deus Supremo do Consumo o mais importante, nos dias que correm, é que os seus devotos devem possuidor de um celular de ultima geração – preferencialmente 5G – um chinelo Raider, apadrinhado pelo Mito; um tênis Nike; um Rolex no pulso, mesmo que falso; camiseta do PSG; bolsas Louis Vuiton; gravatas Hèrmes; no pulso também vale um Cartier; uma Massareti na garagem, etc, etc, etc. E para os devotos do monoteísta Deus Supremo do Consumo os produtos que o identificam o pertencimento à Seita podem ser originais ou falsos, comprados ou roubados. Tanto faz o importante é exibir os valores externos para o Deus Consumo. Aquela velha calça jeans azul e desbotada esqueça de vez ela faz parte a um passado remotíssimo. Aquele cabelo longo, símbolo da paz pendurado no peito num cordão de couro então é coisa de destruidor da natureza. Os antigos hippies que costuravam as bolsas de couros hoje seriam linchados em praça pública. Hoje não. Hoje o leite já nasce em caixas, o arroz nasce embalado e em grãos selecionados, o papel higiênico nasce nos armários da área de serviço, a manteiga é produzida nas montanhas do Nepal com sal rosa do Himalaia e distribuído para todos os supermercados do planeta. Isso sim é ser devoto ao Deus Supremo do Consumo e de quebra você pode ganhar na rifa do supermercado uma AK 47.
E, o pior, é que o Deus Supremo do Consumo não divide altar com outros Deuses. Exige devoção única, totalitariamente única. Não há espaço nas mentes dos seus servos para que possa imaginar uma Rosa de Hiroshima.
E hoje nossa nau da língua portuguesa navega ancora na ilha de Santiago, no arquipélago de Cabo Verde onde nasceu o poeta Jorge Barbosa de quem li, no inicio desse ano aqui no Só a poesia nos Salvará o belíssimo poema intitulado “Você: Brasil”
Hoje lerei de Jorge Barbosa o belíssimo “`Poema do Mar” que reflete a relação de amor e de drama que os descendentes portugueses carregam dentro do peito ainda mais Jorge Barbosa nascido dentro do mar.
POEMA DO MAR
O drama do Mar,
O desassossego domar,
sempre
sempre
dentro de nós
O Mar!
cercando
prendendo as nossa Ilhas!
Deixando o esmalte do seu salitre nas faces dos pescadores,
Roncando nas areias das nossas praias,
Batendo a sua voz de encontro aos montes,
baloiçando os barquinhos de pau que vão Poe estas costas…
O Mar!
pondo rezas nos lábios,
deixando nos olhos dos que ficaram
a nostalgia resignada de países distantes
que chegam até nós nas estampas das ilustrações
nas fitas de cinema
e nesse ar de outros climas que trazem os passageiros
quando desembarcam para ver a pobreza da terra!
O Mar!
a esperança na carta de longe
que talvez não chegue mais!
O Mar!
Saudades dos velhos marinheiros contando histórias de tempos passados,
Histórias da baleia que uma vez virou canoa…
de bebedeiras, de rixas, de mulheres,
nos portos estrangeiros…
O Mar!
dentro de nós todos,
no canto da Morna,*
no corpo das raparigas morenas,
nas coxas ágeis das pretas,
no desejo da viagem que fica em sonhos de muita gente!
Este convite de toda a hora
que o Mar nos faz para a evasão!
Este desespero de querer partir
e ter que ficar!
Assista essa crônica narrada pelo autor
.