Memórias Caiçaras
Texto e ilustração de Arnaldo Passos
Isso aconteceu lá pela década de 90 , na margem do Rio Santo Antônio , em Caraguatatuba
Certo dia, eu , meu pai o João Passos , o nosso amigo o Mané Ratoeira , fomos arrastar picaré no Pontal do Rio Santo Antônio , aquele rio que divide a praia do Centro de Caraguatatuba da praia do Indaiá. No caminho encontramos o vereador Wilson Rangel , o Bicho louco que resolveu nos acompanhar na pescaria. Chegando lá , já estavam pescando no local, o Adauto Gago ,o seu irmão Pedrinho e o Elias do Pedro Zico ( Elias da Sucen). Como a pesca era muito boa ali, eles já estavam com o balaio cheio de tainhas ,e a cada passada de rede ,mais peixe vinha ainda.
Nos aguardamos eles terminarem sua pesca, pois como é de costume dos caiçaras, deve se respeitar quem chegou primeiro no “pontá”( hoje a turma o fala “point” em inglês quando já temos o pontá ou pontal no caiçarês) . Eles, a princípio, educadamente, falaram para o meu pai , que iam dar a última redada e aí nos deixariam entrar. Mas ao dar a última passada de rede , saiu muito mais tainha ainda e eles animados com tanta fartura e um tanto quanto animadas pela cachaça que haviam tomado, não cumpriram a promessa . Aí, o meu pai, João Passos , irritado com a quebra da palavra dos amigos apelou :
– Sendo a última passada ou não, depois dessa, eu caio na água.
Assim foi feito. Tendo a última redada deles vinda lotada de tainha , meu pai entrou na água e nós também, atrás dele . Daí que a coisa esquentou. Mal entramos , já veio um com um facão pra cortar nossa rede ao meio. O Wirso Bicho Louco (ele tem esse apelido por causa do seu sangue quente) que ainda estava fora da água, já caiu no rio e foi pra cima deles ameaçando distribuir sopapos . Só sei que principiou uma confusão daquelas , mas felizmente tudo acabou bem, porque no final prevaleceu o bom senso . Deixaram o mandá como manda a regra e nós ainda conseguimos pescar algumas tainhas .
O problema, depois eles explicaram , é que a turma que estava no rio antes de nós , já haviam tomado um pouco a mais da conta, da marvada cahaça que levaram para animar a pescaria e por isso deu essa confusão. Afinal, o caiçara respeita o Pontal e respeita os seus amigos. Confusão só tem se tiver uma marvada pelo meio.
Essa historia eu conto em memórias do meu pai João Passos , e dos meus amigos Manoel Menezes ( o Ratoeira) e Pedrinho que já nos deixaram