Diário do ano da peste de 27 de outubro 2021
Texto e vídeo Marcus Ozores
E hoje é quarta feira dia 27 de outubro e o céu está cor de chumbo até nas milenares areias das praias dos Tupinambás de Barequeçaba e continuo lançando granadas contra o besteirol com o “Só a poesia nos Salvará”.
Como hoje não deu para ir à praia, como faço todas as manhãs, fiquei lendo deitado na rede e fiquei observando minha gata dando saltos e cambalhotas na tentativa de caçar mosquitinhos invisíveis, para meu olhar. Acho que fiquei assim naquele lenga lenga do balanço da rede umas três horas e comecei a refletir o que seria da minha vida, nessa pandemia, sem a companhia da Catarina e da Lavínia. Aliás os nomes das gatas foi escolhido em homenagem à minha avó paterna e à avó paterna da Wilma.
E fiquei na rede refletindo sobre a relação homem x gato nesses últimos 40 mil anos. Sem a companhia desses felinos a civilização egípcia nunca teria saído da idade da pedra polida. Afinal, foram os felinos que ao pularem em busca de lagartixas nas paredes que despertaram o gênio criativo de Imhotec, o arquiteto polímata que projetou as primeiras pirâmides do Egito.
Também foi um gato que subiu na macieira e derrubou a maça na cabeça de Isacc Newton. E no laboratório de Lavoisier foi a gata Fifi que derrubou um frasco de ácido numa experiência e o gênio da química proferiu a mais sábia frase já dita por um humano “ nada se perde, tudo se transforma”.
Quem não tem um felino ao lado, profere frases como o do nosso capitão quinta feira passada: “Um trabalho cientifico britânico aponta que quem tomou duas doses da vacina da covid tem maior propensão a desenvolver a AIDS”.
E para fugir dessa irracionalidade brasiliana vamos ouvir um poema do poeta português Manuel Maria Barbosa du Bocage , nascido em Setúbal, às margens do rio Sado, em Portugal, no dia em 1765 e falecido em 1805. Bocage, de quem já li anteriormente poesias, foi precursor do Romantismo em Portugal, porém, ficou mais conhecido como poeta satírico, erótico e pornográfico, e é vítima até hoje de sua própria fama e dos preconceitos que despertou.
Os Dois Gatos
Dois bichanos se encontraram
Sobre uma trapeira um dia:
(Creio que não foi no tempo
Da amorosa gritaria).
De um deles todo o conchego
Era dormir no borralho;
O outro em leito de senhora
Tinha mimoso agasalho.
Ao primeiro o dono humilde
Espinhas apenas dava;
Com esquisitos manjares
O segundo se engordava.
Miou, e lambeu-o aquele
Por o ver da sua casta;
Eis que o brutinho orgulhoso
De si com desdém o afasta.
Aguda unha vibrando
Lhe diz: ”Gato vil e pobre,
Tens semelhante ousadia
Comigo, opulento, e nobre?
Cuidas que sou como tu?
Asneirão, quanto te enganas!
Entendes que me sustento
De espinhas, ou barbatanas?
Logro tudo o que desejo,
Dão-me de comer na mão;
Tu lazeras, e dormimos
Eu na cama, e tu no chão.
Poderás dizer-me a isto
Que nunca te conheci;
Mas para ver que não minto
Basta-me olhar para ti.”
”Ui! (responde-lhe o gatorro,
Mostrando um ar de estranheza)
És mais que eu? Que distinção
Pôs em nós a Natureza?
Tens mais valor? Eis aqui
A ocasião de o provar.”
”Nada (acode o cavalheiro)
Eu não costumo brigar.”
”Então (torna-lhe enfadado
O nosso vilão ruim)
Se tu não és mais valente,
Em que és sup’rior a mim?
Tu não mias?” – ”Mio.” – ”E sentes
Gosto em pilhar algum rato?”
”Sim.” – Eo comes?” – ”Oh! Se como!…”
”Logo não passa de um gato.
Abate, pois, esse orgulho,
Intratável criatura:
Não tens mais nobreza que eu;
O que tens é mais ventura.”