Diário do Fim do Mundo
Texto, vídeo e apresentação de Marcus Ozores
Diário de Prá Lá do Fim do Mundo, quinta feira, dia 28 de abril do ano cinzento de 2022 e eu estou aqui na minha segunda república anarquista da Praça Buenos Aires, tendo ao fundo a obra os imigrantes, de Lasar Segall e eu continuo firme na tentativa de continuar com mente sã , lançando granadas do ‘Só a poesia nos Salvará’ da insanidade geral.
Temos assistido, com apreensão, a explosão do desrespeito às instituições federais e o desrespeito ao poder tripartite dos Poderes da República. Porém – e como toda história tem vários poréns – a escolha, ontem, do nome de um mau policial para vice-presidente da Comissão de Justiça, a mais importante da Câmara dos Deputados, escolhido por seus pares deixou uma marca indelével – para história da nossa República – pela total falta de respeito. No fundo podemos dizer, sem errar, que há algo de muito podre no reino e que os estudiosos chamam de ‘espirito, ou da alma’ de um país.
Sabemos que existem milhares de explicações para definir o que é ser brasileiro ou brasileira. Estudos que vão desde falta de oportunidades, passando pela ausência do Estado em vários setores e nas políticas públicas , até estudos sobre a implicação das novas mídias sociais e uma nova ordem tecnológica. Todas esses estudos, tentam explicar o avanço desse clima fascista que parte da população mergulhou, em defesa das sinecuras e prebendas.
Eu, nascido numa pequena aldeia do interior de São Paulo, nunca me enganei, desde criança, com aquilo que os filósofos alemães chamam ‘geist’, isto é, o espirito, o pensamento do que é ser brasileiro. Para mim esse geist, esse espírito, sempre foi violento e a prova é que as questões agrárias nesse brasilzão, sempre foram resolvidas historicamente, desde os tempos imemoriais, na ponta de facas afiadas , ou nos canos das espingardas.
Historicamente, podemos afirmar que uma fina casca de civilização , sempre foi o que garantiu ao país não colapsar moralmente, já que os caraíbas que governaram as Terras de Pindorama, desde 1889, sempre desrespeitaram as várias Constituições, mas sempre respeitaram a opinião dos estrangeiros sobre nós, o chamado povo brasileiro. Esse equilíbrio, sempre, sempre, foi tênue, mas respeitado, pelo menos na aparência se ocorria algo nebuloso , sempre era à portas fechadas e em porões escuros com vergonha da prática desses atos.
Mas , tudo mudou quando o Capitão foi catapultado ao cargo do Caraíba mor da República de Pindorama. E, ontem, aquela linha tênue que separa a sanidade e a loucura caiu de vez, quando o mau policial carioca, condenado pelo STF a 8 anos de prisão, foi salvo das grades pela graça do Capitão. Foi rompida toda essa linha tênue, no momento que os deputados do – partido trabalhista brasileiro – criado pelo inventor do Estado brasileiro moderno, Getúlio Vargas – indicaram o nome desse mau policial carioca para a Comissão de Constituição e Justiça. Nesse momento e, seguido da festa das bancadas da Biblitralhadora, nos salões do Planalto Central, para comemoração pública do escárnio à Nação. O ponto alto do escárnio foi o abraço fraterno com que o Capitão acolheu o mau PM carioca. A pergunta que fica é se o abraço foi do anjo ou do demônio, pois, os caminhos obscuros que levaram a essa união do Capitão e do mau policial, ainda não foram totalmente esclarecidos.
Nesses 37 anos do retorno do Brasil à convivência democrática e o respeito à Constituição e à divisão de poderes tripartites, creio que, lastimavelmente, a linha tênue do respeito aos cidadãos e cidadãs brasileiros e brasileiras, foi definitivamente rompida.
Face a esse circo dos horrores que vivemos cotidianamente, nos últimos três anos e meio, veio-me à lembrança um trecho da comédia “As You Like It” (“Como Você Quiser”), escrita pelo bardo inglês William Shakespeare, em 1599, e é um exercício irônico de meditação sobre a passagem da vida humana. O trecho que vou ler para vocês pertence à Cena Sete do Ato II.
As You Like Come
Willian Shakesperare
Cena 7
Um personagem da comédia afirma:
“Agora são dez horas e você pode ver como o mundo oscila;
há uma hora eram nove, dentro de uma hora serão onze;
a cada hora que passa nós amadurecemos;
a cada hora apodrecemos;
nisso há toda uma história.”
-A heroína da peça Rosalind e sua prima Celian fugindo da ira do seu tio e rei de um Ducado na França medieval, fogem da corte e entram na floresta de Arden encontrando vários personagens que fazem parte da peça e dentre eles o inesquecível um caminhante melancólico que atende pelo nome de Jacques e que faz o discurso a seguir:
“O mundo inteiro é um palco,
E todos os homens e mulheres são meros atores:
Eles têm suas saídas e suas entradas;
E um homem cumpre em seu tempo muitos papéis.
Seus atos se distribuem por sete idades.
No início a criança
Choraminga e regurgita nos braços da mãe.
E mais tarde o garoto se queixa com sua mochila,
E seu rosto iluminado pela manhã, arrastando-se como uma lesma
Sem vontade de ir à escola.
E então o apaixonado,
Suspirando como um forno, com uma balada aflita,
Feita para os olhos da sua amada.
Depois o soldado,
Cheio de juramentos estranhos, com a barba de um leopardo,
Zeloso de sua honra, rápido e súbito na briga,
Buscando a bolha ilusória da reputação
Até mesmo na boca de um canhão.
E então vem a justiça,
Com uma grande barriga arredondada pelo consumo de frangos gordos,
Com olhos severos e barba bem cortada,
Cheio de aforismos sábios e argumentos modernos.
E assim ele cumpre seu papel.
A sexta idade o introduz
Na pobre situação de velho bobo de chinelos,
Com óculos no nariz e a bolsa do lado,
Suas calças estreitas guardadas, o mundo demasiado largo para elas,
Suas canelas encolhidas, e sua grande voz masculina
Quebrando-se e voltando-se outra vez para os sons agudos,
Os sopros e assobios da infância.
A última cena de todas,
Que termina sua estranha e acidentada história,
É a segunda infância e o mero esquecimento,
Sem dentes, sem mais visão, sem gosto, sem coisa alguma.”