Meu primeiro amigo de escola na Enseada

Recordações Caiçaras
Crônica de João Batista Antunes, o Joban
No meu primeiro ano escolar conheci Israel. Naquela época as escolas rurais eram diferentes das de hoje. Havia apenas uma sala com um único professor para as três séries, a 1ª, a 2ª e a 3ª do antigo primário (hoje ensino fundamental), por isso havia alunos de idades diferentes misturados O meu primeiro professor, quando eu ingressei na escola no ano cristão de 1960 era o professor Waldir, que os caiçaras, pais dos alunos, o chamavam por “Wardizão” , porque ele era um loiro de olhos verdes com quase um metro e noventa de altura. Os menorzinhos, como eu, conviviam com garotos maiores na mesma sala e isso era uma dificuldade durante a hora do recreio, porque os maiores não deixavam os “pequitititos” brincarem sossegados. Sempre os maltratavam. Mas, nós os moleques caiçaras de praia estávamos acostumados com as dificuldades da vida.
A escola ficava perto do único armazém (o mercado da época) que havia bairro da Enseada em Ubatuba, Casa Maciel, construída pelo Francisco Maciel e que então pertencia ao seu filho, Altino Maciel onde meu pai, o seu Antunes era o gerente. Por isso a maioria dos garotos maiores me respeitavam, porque meu pai era um mulato alto e forte e eles o temiam, mesmo ele sendo um mulato de fala mansa e sempre disposto a servir a todos. Mas em compensação, os outros garotos sofriam, chacotas, desprezo e todo tipo de violência, ou seja, todo mundo bolia com eles (hoje usam a palavra inglesa bullying que nós já usávamos no caicarês pois falávamos bolir)
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Israel era um deles. Tinha dez anos, era forte, mas por prováveis deficiências de aprendizado ainda estava na primeira série, e por sua pigmentação de pele diferente, -por ser um afrodescendente como meu pai, sofria o desprezo preconceituoso por parte dos outros alunos. Apenas eu brincava e convivia com ele. Juntos, no recreio, íamos ao armazém que meu pai trabalhava e ali lanchávamos.
Eu amava aquele pretinho que, apesar de toda dificuldade, trazia sempre um sorriso lindo no rosto. Para mim era como se fosse um irmão que eu não tinha. Lembro-me de uma vez que um garoto da terceira série, com doze anos de idade me atacou e Israel o atacou e o espancou para me defender.
A vida nos levou para rumos diferentes, mas até hoje ainda sinto saudades do meu pretinho da primeira série. Sei que convivemos apenas um ano, mas para mim é como se fosse uma eternidade. Hoje eu pergunto: por onde andará o meu irmão Israel?
Durante toda a minha vida, tive outros amigos. Dentre eles japoneses, índios, afrodescendentes, usuários de drogas, dos mais variados tipos e raças. Mas, para mim, Israel foi o mais importante deles. Gostaria que ele pudesse ler esse texto e que de onde ele estiver, me mandasse uma lágrima de saudades.
Nossa Jobam mais uma vez vc me emocionou;mas lindo o valor da amizade e do afeto.
Obrigado minha amiga, fico contente que você gostou bjs
Muito bom Joban
Sempre com muita sensibilidade.