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Quando a política se decidia por versos e bons discursos e amizade

Por Pitágoras Bom Pastor

Ilustração: Arnaldo Passos

Acredito que a partir da eleição do Collor de Mello em 1989 , as eleições brasileiras, seguindo o modelo americano, tornaram-se extremamente caras. Com essa inflação no custo do voto ,empresários que antes financiavam candidatos, passaram a reivindicar o lugar de candidatos e a partir de então, mais do que antes a política tornou-se um balcão de negócios.

A campanha para prefeito de Caraguatatuba em 1992 disputada entre 2 empresários, Antônio Carlo e Sidnei Trombine, foi a primeira no Litoral em  que se gastou altíssima soma de dinheiro. A disputa não foi entre quem tinha melhor discurso , ou a melhor proposta, mas entre que tinha mais dinheiro e melhor sabia gastá-lo.

Trombini e Altamir

A eleição de 1996 ,igualmente foi decidida na força do poder econômico.
Essa eu acompanhei por dentro como coordenador de marketing da Campanha do 2o colocado , Bourabeby e pude testemunhar o seu custo , muito acima do declarado na Justiça Eleitoral, como é de praxe. Ganhou Antônio Carlos o mais rico.

A consequência, tanto em nível nacional, quanto em nível municipal foi uma degradação da política. Eleicão hoje não se decide por palavras e discursos, mas sim pela força do dinheiro. Mas quem investe vai querer seu dinheiro de volta e com lucros. Aí a razão dos mensalões que há por quases todas as cidades do Brasil,ocultos pela lei do silêncio.

Mimeógrafos e gráficas de fundo de quintal eram marketing político de antigamente

Nas eleições anteriores, eram políticos que decidiam com bons argumentos e excelentes discursos, as eleições.
Em Caraguatatuba ,o  rei da oratória, foi o duas vezes ex-prefeito Altamir Tibiriçá Pimenta  (seu último 
mandado de prefeito foi entre 1957 a 1959) que era poeta e jornalista. Seu maior adversário em campanha, como 
orador e pasquinista,segundo ele me contou, foi Pedro Guilherme Wack, avô do famoso jornalista Willian Wack,
um engenheiro bom de verso e de argumento, porém,  por sorte do Altamir, era ruim de voto, talvez porque fosse 
da capital Paulista. Na década de 50, Altamir e Wack trocaram ofensas em versos.  distribuidos em folhetos pasquins 
pelas ruas da cidade.  Lembro que Altamir num Pasquim ofendeu Pedro com um verso que dizia algo como:
" Pedro wack:  não é vaca, não é nada" . Não me lembro da sequência do Pasquim, mas era isso.Os panfletos eleitorais 
eram feitos em mimeógrafos e gráficas de fundo de quintal e  material da campanha não passava muito disso.

Na eleição de 1976, para prefeito de Caraguatatuba ,  o ex -prefeito Geraldo Nogueira da Silva, Boneca,  atacou seu rival,  Bourabeby, médico chefe do Posto de Saúde do estado,  (o único centro médico que atendia à população da cidade em geral e principalmente os mais pobres)   que acabou sendo eleito naquela eleição , com o seguinte argumento literalmente animal. ” Estão  falando que o Bourabeby disse que se não for eleito, não vai dar mais leite no Centro da Saúde pra ninguém. Não vai dar mesmo porque ele não é vaca!” Bourabeby venceu o candidato bonequista , Rui Barbosa de Moura.

O Barro de Adhemar

Altamir gostava de contar uma história que Adhemar de Barros chegando por aí numa praia caiçara encontrou um caiçara que versava de improviso e pediu lhe que fizesse um verso para o governado Adhemar de Barros. O caiçara não se fez de rogado e soltou a seguinte quadra:

” Adão foi feito de barro,
De barro bom e batuta
Mas esse Adhemar de barro
Que barro Filho da puta”

Os pasquins Caiçaras

A pouco tempo passado Zizinho Vigneron, historiador de Ubatuba,  enviou-me o seguinteabaixo sobre os pasquim. Aliás a última grande  eleição  pra prefeito  de Ubatuba  que envolveu 2 ótimos e cultos políticos,  foi a eleição  de 1982, quando Zizinho,  historiador  e Pedro Paulo,  poeta disputaram a vaga de prefeito. Ambos eram também professores da rede pública. Zizinho de História e Pedro de Português  . Pedro,  aliás por ser muito espirituoso e ótimo orador , venceu a Zizinho ,  que embora muito  sábio e querido na cidade , era porém mais tímido e menos comuincativo. Zizinho  só conseguiu se eleger prefeito  em 1996 , mas  teve dificuldades  na prefeitura. Afinal  ele era da velha e boa escola da política,  onde  a conversa era o que decidia não os meios  que hoje  prevalecem. Mas vamos ao material fornecdo por Zizinho, logo após as fotos.

, Zizinho Vigneron e sua esposa Regina

Primeiro jornal de Ubatua, o Echo Ubatubense já denuncaiva o pasquinismo

O Jornal ECHO UBATUBENSE, pioneiro jornal de Ubatuba, em   de 1897, publicou a seguinte matéria de um rdator irritado:

” Chamamos a atenção das autoridades para certos vagabundos  miseráveis , que empregando seu tempo em fazer pasquim, offendem corporações importantes e individualidades respeitáveis.

Esses indivíduos vis  que se dedicam a semelhante empreza, bem merece o desprezo do povo e a punição da justiça.

O  pasquineiro é mais perigoso que o assassino , deshonra a sociedade e põe em perigo a honra da familia.

E o jornal ainda alertava que a pena pra isso, segundo o código criminal da época” era de  de prisão celullar ,.de 6 mesesa douz anos e multa de 500$000 a 1000$000″. O Pasquineiro realmente incomodava os poderosos de plantão.

 

Veja no  EchoUbatubense – acervo Zizinho Vignero.

Os Pasquins no Litoral Norte de São Paulo e Suas peculiaridades na Ilha de São Sebastião.

“Os pasquins …. anônimos, circulando sorrateiramente por debaixo das portas, visando influenciar a opinião pública, acerbos(1) na crítica às pessoas de relevo na política local,cheios de desabafos e rancores pessoais ,condiziam perfeitamente com a ideia que o termo denota.

… Contudo ,as informações que pude obter desde São Sebastião até Ubatuba, permitem afirmar que o emprego do pasquim é generalizado e que há muitos aspéctos em comum na sua confecção…”

A folclorista  Gioconda  Mussolini  escreveu ainda sobre  os pasquins:

“Nascidos na Itália com o nome de Pasquino foram introduzidos ainda no Brasil colônia e aportuguesado para Pasquim e as vezes pronunciados como Paxins.A ausência de imprensa e carentes de comunicação, os pasquins desempenhavam um papel de críticas à sociedade da época,a política,a economia ou fatos mundias que afetavam a comunidade.

Como eram críticos evidentemente que foram sempre anônimos.Os pasquins são versos rimados tirados inicialmente numa viola e depois transcritos em papéis.Vem daí o termo tirar um pasquim.Muitas vezes seus autores eram analfabetos mas com habilidade na construção de versos.Após confeccionados, os mesmos eram transcritos em papéis e para divulgação e afixados em locais públicos ou por debaixo das portas com garantia de que seriam veiculados.

A cultura de pasquins se passava de pai para filho ou pessoas de confiança que garantiam sua permanência.A voracidade do texto em anexo denota que eram extremamente mal vistos pelas classes dominantes e políticas da época e por isso a linguagem repressiva ,dura e rancorosa em relação aos pasquineiros

Abaixo trecho de um pasquim do litoral norte sobre a segunda guerra mundial.

“Me permite atenção senhores
Do causo qu’eu vô contá
Das tristezas que passamo
Aqui no nosso lugá
A falta do querozene
Do açúcar e do sá.

Sofremo necessidade
Por essa primeira veis
Por causa da malvada Rússia
Do alemão e do ingleis
Comemo comida doce
Fazendo a veis de japoneis.

…O povo tinha remorso
Da tristeza que havia
Da miséria em Europa
Do sangue que lá corria
Do que os jorná anunciavom
Dos côrpo que lá morria.

…Nas revistas o que se via
As maiores invenção:
Milhares de boca de fogo
Na caipitá alemão
Na maior profundidade
Em trinta metros de chão.

…Vamos nois falá do Hitre
No consumo que levô
Dizem que ele fugiu
Mais por onde êle passô?
Num se sabe se êle é vivo
Ou se o diabo carregô!

Um home como o Hitre
Num se deve de aceitá
Não deve ter preferência
Em nenhuma capitá
Porque deu que fazê no mundo
E acabô nosso lugá”.

Pasquim contido na obra de Gioconda Mussolini citada no início  do texto.

Vejam que o pasquineiro em questão inicia seus versos tratando de uma problemática que os aflige:

a Segunda Guerra Mundial.
Versa sobre a mesma e conclui afirmando:”acabou nosso lugá”.

Altamir x Pita do Tinga

Altamir Pimenta – Arte de Arnaldo Passos

Somente pra mostrar o potencial de paquinista do ex-prefeito Altamir Tibiriçá Pimenta, reproduzo aqui parte de um pasquim em acróstico que ele fez em minha desohomenagem, em tom evidente de brincadeira, por volta do ano de 1976 , quando eu, com 15 anos de idade , era seu companheiro de boemia. Vejam:

Puto da vida ele ficou
Instinto desvairado e mouco
Tanto ele amava, tanto ele amou
Acabou doido ficando louco.

O pior que Altamir foi profético, em 1999, Pita do Tinga, em razão de seus desequilíbrios emocionais dessa emoção que abunda os étilo-poetas, acabou doido ficando louco e foi buscar sua cura no Hospital do Servidor público estadual, transformando-se no respeitável e “caratésimo”, Sr. Pitágoras Bom Pastor.

Assim  era a boa política de antigamente , feita por políticos profissionais e não por empresários negociantes de votos e orçamentos públicos.

A Cancioneiro Caiçara tem o apoio cultural da Hidrel. Uma empresa genuinamente caiçara.

 

Pitagoras Bom Pastor

Pitágoras Bom Pastor de Medeiros, é formado em direito e pós graduado em jornalismo digital

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4 Comentários

  1. Tempos bons, que a gente de duvertia nos comícios. Hoje pra ser politico tem mesmo que ser milionário, sem contar que a família inteira se tornam políticos, é o melhor negócio para o enriquecimento ilícito.

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