
Um artigo do jornalista Gustavo Zeitel, na Folha de S. Paulo desta semana, me deixou intrigada. Segundo ele, pouco importa a linha de pensamento e conduta do novo Papa: a Igreja Católica no Brasil seguirá, inevitavelmente, mais conservadora. O pontífice poderá até continuar a linha de ação de Francisco ou não — isso não fará diferença.
A ascensão do bolsonarismo entre católicos parece imune às posições progressistas do Vaticano, especialmente com vistas às eleições do próximo ano.
Uma igreja com lado político
Para o articulista, basta observar o crescimento de instituições como a Opus Dei, o Centro Dom Bosco e as postagens populares de figuras como o padre Paulo Ricardo ou o frei Gilson. Todos representam uma visão tradicionalista da Igreja que conquista cada vez mais adeptos.
Setores dessa ala conservadora rejeitam abertamente a postura de Francisco sobre a acolhida às pessoas LGBTQIA+, a maior participação das mulheres na estrutura eclesial e até mesmo temas como o desenvolvimento sustentável. Essa rejeição persiste, mesmo que o Papa não tenha promovido reformas profundas na estrutura da Igreja.
O país que troca de fé
Projeções do IBGE indicam que, em apenas sete anos, o Brasil será um país de maioria evangélica — um segmento historicamente mais conservador. Isso altera profundamente o perfil religioso e político da população.
Nos anos da Ditadura Militar, setores progressistas da Igreja Católica foram vozes de resistência, numa opção preferencial pelos pobres e excluídos. Mas com o pontificado de João Paulo II, esse ímpeto foi contido. Vindo da Polônia comunista e traumatizado pela perseguição religiosa, o Papa polonês via com desconfiança a Teologia da Libertação e sua aproximação com o marxismo.
Quem manda na fé brasileira?
Foi João Paulo II quem estabeleceu a aposentadoria obrigatória dos bispos aos 70 anos — decisão que tirou de cena figuras como Dom Evaristo Arns e Dom Hélder Câmara, ligados ao povo. Enquanto isso, bispos conservadores, como Dom Eugênio Salles, permaneceram ativos até os 90. A mudança abriu espaço para o avanço de uma Igreja mais alinhada ao conservadorismo.
As Comunidades Eclesiais de Base, que floresciam nas periferias urbanas, foram desmobilizadas. Em seu lugar, igrejas evangélicas ocuparam o espaço — com propostas políticas claras e um projeto de presença na estrutura jurídica do país.
Fé, poder e eleição
A reportagem cita ainda o coordenador do Núcleo de Fé e Cultura da PUC-SP, que afirma: “O destino do voto católico será decidido caso o atual governo consiga dar respostas para três temas: corrupção, transparência e apoio à família.”
Enquanto isso, permanece a pergunta: a fé brasileira está a serviço de Deus — ou do poder?
Muito bom