Nada de novo na guerra

Diário de Pindorama
Texto, video e apresentação de Marcus Ozores

Diário de Pindorama, 23 de fevereiro de 2022, início do nosso terceiro ano da Peste e, por isso mesmo, continuo aqui com o “Só a poesia nos Salvará” tentando afastar o baixo astral que nos cobre a peste e a demência geral da nossa amada Belíndia. E por isso continuo aqui isolado na minha República Livre Anarquista dos Tupinambás de Barequeçaba.
O noticiário das últimas semanas dá conta que o clima de insegurança no mundo está aumentando com as escaramuças fronteiriças entre soldados da Rússia e da Ucrânia andam fazendo , aumenta a possibilidade de eclodir uma guerra que poderá envolver os países membros do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), organização essa, criada pelos EUA, após o termino da Segunda Guerra Mundial. Eclosão de uma guerra nessa região é incontrolável. lembrando que antes da União das Republicas Socialistas Soviéticas ruir em 1989, a Ucrânia concentrava o maior arsenal de misseis atômicos da antiga URSS.
O pior, é que com esse clima de pré-guerra, é escutar centenas de jornalistas tupiniquins e analistas de meia pataca falando sobre geopolítica já que conhecem a Ucrânia pelo Google Maps. A desinformação se agrava já que boa parte desses jornalistas analistas são divulgadores de “press releases” dos serviços secretos, dos países envolvidos.
Cansado de ouvir besteira me lembrei do livro ‘Nada de Novo no Front’ de autoria de Erich Maria Remarque, lançado em 1929, na Alemanha e que faz sucesso desde então junto a milhares de jovens que o leem no colegial. O livro foi traduzido para mais de 58 línguas e Hollywood transformou o livro em filme em 1931, tendo vencido de três Oscar. Erich Maria Remarque largou a universidade em 1914, aos 18 anos, para lutar nas trincheiras durante a guerra de 1914 – 1918.
“Nada de novo no front” é um choque de realidade, um alerta para a sociedade. A guerra não é uma aventura e muito menos uma prova de patriotismo ou mesmo de coragem e masculinidade. Ela também não é uma “diplomacia por outros meios”. A guerra mata mesmo quando se sai vivo dela, destaca Remarque que foi ferido três vezes durante a I Grande Guerra, sendo que uma delas gravemente. Em 1933 Remarque foi expulso da Alemanha nazista acusado de desvirtuar os jovens com seu livro.
Quando a I Grande Guerra terminou e mandatários dos países vitoriosos afirmavam que aquela Guerra havia sido tão sangrenta e tão insana que nenhuma outra guerra poderia ocorrer em território europeu. Vinte e um anos depois, em 1939, o kaiser alemão, que na verdade era um austríaco lunático, decidia invadir a Polônia e daria início a mais sangrenta de todas as guerras. A II Guerra Mundial.
E é por isso que hoje lerei uma crônica curta, da escritora Lygia Fagundes Telles, intitulado ‘A disciplina do Amor’ livro lançado em 1980 e que narra o amor de um cão ao seu dono, um soldado que morre em combate durante a II Guerra Mundial, na França.
A DISCIPLINA DO AMOR

Foi na França, durante a Segunda Grande Guerra. Um jovem tinha um cachorro que todos os dias, pontualmente, ia esperá-lo voltar do trabalho. Postava-se na esquina, um pouco antes das seis da tarde. Assim que via o dono, ia correndo ao seu encontro e, na maior alegria, acompanhava-o com seu passinho saltitante de volta a casa.
A vila inteira já conhecia o cachorro e as pessoas que passavam faziam-lhe festinhas e ele correspondia, chegava a correr todo animado atrás dos mais íntimos para logo voltar atento ao seu posto e ali ficar sentado até o momento em que seu dono apontava lá longe.
Mas eu avisei que o tempo era de guerra, o jovem foi convocado. Pensa que o cachorro deixou de esperá-lo? Continuou a ir diariamente até a esquina, fixo o olhar ansioso naquele único ponto, a orelha em pé, atenta ao menor ruído que pudesse indicar a presença do dono bem amado. Assim que anoitecia, ele voltava para casa e levava sua vida normal de cachorro até chegar o dia seguinte. Então, disciplinadamente, como se tivesse um relógio preso à pata, voltava ao seu posto de espera.
O jovem morreu num bombardeio, mas no pequeno coração do cachorro não morreu a esperança. Quiseram prendê-lo, distraí-lo. Tudo em vão. Quando ia chegando àquela hora ele disparava para o compromisso assumido, todos os dias. Todos os dias.
Com o passar dos anos (a memória dos homens!) as pessoas foram se esquecendo do jovem soldado que não voltou. Casou-se a noiva com um primo. Os familiares voltaram-se para outros familiares. Os amigos, para outros amigos. Só o cachorro já velhíssimo (era jovem quando o jovem partiu) continuou a esperá-lo na sua esquina, com o focinho sempre voltado para aquela direção.

Your point of view caught my eye and was very interesting. Thanks. I have a question for you.