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Hiroshi fotógrafo, o “nheco nheco” e o “ladrono”

Causos da Proeira

Crônica de  Priscila Siqueira

 

Hiroshi era um senhor japonês com a calma oriental e alma de menino. Fotógrafo da cidade, tinha sua loja na pracinha Antônio Argino, ao lado da Igreja Matriz de São Sebastião. Sua esposa, Maria, era sua vizinha com a melhor loja de roupas na cidade daquela época.

Ele contava que, quando o Japão havia perdido a Guerra, o trem do qual seria evacuado na zona onde estava, ficou abarrotado de soldados e não havia mais lugar para eles e outros companheiros. Então, eles se agarraram nos ferros externos do trem e aí viajaram. Só que começou a nevar. Quando o trem chegou ao seu destino, alguns de seus companheiros estavam mortos-congelados pelo frio. Ele precisou ser resgatado porque não conseguia se mover, duro como uma pedra…Sorte que ficou sem sequelas nas mãos e nos pés, que poderiam gangrenar nessas circunstâncias.

Hiroshi foi um dos fundadores do Clube de Serviço, Rotary, e era considerado o associado mais fiel, sem nunca ter perdido um única reunião.

Uma vez, quando fui em uma viagem ao estrangeiro, comprei um máquina semiprofissional para tirar as fotografias que minha profissão de repórter exigia. Nada entendia de fotografia, anda mais com aquela máquina toda sofisticada. Lá fora, meus colegas me ajudavam, mas quando cheguei a aqui não conseguia mexer na dita cuja. Fui ao Hiroshi e tive a melhor aula que um aspirante a fotógrafo pode ter:

– “Hiroshi, por favor me ajude. Minha máquina não faz “click click”…”eu desabafei.

– “Você fez “nhinheco nheco”, perguntou o professor. “Sem “nhinnheco  nheco”, não tem “click click”, respondeu Hiroshi.

Entendi: sem rebobinar o filme, a máquina não poderia tirar fotos…

Mas a melhor desse grande amigo, aconteceu quando sua loja foi roubada. O ladrão, para levar as máquinas fotográficas expostas, quebrou o vidro da vitrine. Hiroshi com sua calma oriental, mandou consertar a vitrine. Pouco tempo depois, a mesma coisa: O vidro quebrado, mercadoria roubada. Hiroshi não teve dúvida. Ele colocou uma faixa com letras em grandes grudada no vidro, com os dizeres;

“Senhoro ladrono, se quiser a máquina, peça. Vidro muito caro”.

 

Priscila Dulce Daledone Siqueira é jornalista aposentada , escritora e ativista social e Proeira Mestra de redação e conteúdo da Rádio Revista Cancioneiro Caiçara Caiçara

Priscila Siqueira

Priscila Dulce Daledone Siqueira Nasceu Ponta Grossa, PR, em 1939. Cursou jornalismo UFRJ; Foi pioneira no jornalismo ambiental. É uma das fundadoras do Movimento de Preservação de São Sebastião e da Sociedade de Defesa do Litoral Brasileiro, além de ser uma das fundadoras da SOS Mata Atlântica. Foi professora da Escola Normal de São Sebastião

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6 Comentários

  1. Querida Priscila, lindíssima nesta foto, de olhos doces e alma aberta, como sempre….proeira da nossa profissão…seus causos são deliciosos!
    Viva Hiroshi e todos os descendentes japoneses de nossa região!!!!

  2. Sempre maravilhosas essas histórias! Eu era criança em São Sebastião e morria de medo do senhor Hiroshi haha. Quando tinha que ir fazer foto 3×4 eu quase suava frio. Mal sabia eu que a fotografia seria minha linguagem de trabalho e que o estúdio do senho Hiroshi (que na verdade era um homem super gentil), foi minha primeira entrada nesse mundo tão maravilhoso das imagens. Viva tia Priscila e viva suas histórias! 😘

  3. Conviver com Priscila, há mais de 36 anos, é um privilégio. Seu jeito de viver fez de mim uma pessoa melhor. Uma das coisas que me ensinou foi jamais perder a Esperança. Adoro seus livros e os causos que conta! Uma mulher maravilhosa!

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